Tuesday 5 November 2013

Gaile


Tinha uma data de coisas para dizer, mas esta história, não resumindo, atalha. Esta rapariga é a Gail Russell. Fez um filme de terror nos anos 40, chamado The Uninvited, que eu vi neste fim de semana. No filme, faz de uma rapariguinha tímida e assombrada pelo passado. Na vida real, era uma rapariguinha tímida e, de certa maneira, assombrada pelo futuro. Era de tal maneira tímida que precisou de começar a beber para conseguir representar aquele papel de rapariga tímida. Vai daí desenvolve um novo vício que levaria à sua morte. Há que ver isto como é: há certas coisas que, sendo nossas, não nos deixam fazer de nós próprios. 

Friday 1 November 2013

Ainda Carrilho

Ontem, durante uns minutos, o DN permitiu a publicação de comentários à crónica semanal de Carrilho. E um deles começava assim: “Cale-se, seu abusador de mulheres!”. Tudo neste comentário, anónimo, me parece absolutamente brilhante. É brilhante nos termos. O “cale-se!”, que é ao mesmo tempo injurioso e formal, é agressivo mas é cordato, é pessoal mas é dito por um anónimo. O “abusador”, aportuguesamento recente do abuser, denota uma aculturação anglo-saxónica, todavia incompleta, porque utilizado para denegrir publicamente a vida privada de alguém. O “mulheres” demonstra precisão – eu sei que é mais do que uma – e indefinição – mas quantas são?, luz e bravura de quem volta da caverna platónica para esclarecer o mundo, mas também escuridão e derrotismo de um Turner, de quem aceita as nuances de um homem face ao desconhecido, face ao sublime.

Tem ponto de exclamação mas é questionável, é preciso mas incompleto, é irado mas tem pausa. E é o melhor exemplo que posso encontrar para o que os pós-modernos chamam a “hiper-realidade” deste caso Carrilho. Neste sentido, a vida de Carrilho é mais filosófica e atual do que a sua filosofia.